Com a proposta de tentar mostrar “a vida como ela é” e “as pessoas como elas são”, os reality shows ganham notoriedade e novos telespectadores a cada edição. Eles têm vários formatos, seja de confinamento em casas ou fazendas, como também aqueles que põem os participantes em lugares inóspitos para que sobrevivam. O certo é que esses modelos de programa conseguem atingir índices muito altos de audiência, ao submeter os integrantes a situações que eles evitariam se estivessem seguindo a vida normalmente.
O primeiro reality show, ‘An American Family’, foi ao ar em 1973, nos Estados Unidos. Produzido pela rede pública PBS, seu enredo era transmitir o dia a dia de uma família de classe média. Os programas do tipo tomaram mais forma e presença nos anos 1990 com Survivor, produção do Reino Unido adotada pela emissora americana CBS. Assistir à tentativa de sobreviver em lugares inóspitos foi um sucesso e levou o programa a ganhar versões em muitos países, inclusive no Brasil, onde a TV Globo reproduziu o formato no ano 2000, em seu programa No Limite.
Outro formato bastante conhecido hoje, também teve seu lançamento no final da década de 1990. O Big Brother é uma produção holandesa que também ganhou o mundo. Inspirado no livro 1984, de George Orwell, esse formato reúne pessoas, as confinam por determinado tempo e as fazem competir entre si para saber quem leva a premiação milionária. No Brasil, o formato foi trazido em 2001, com os programas Casa dos Artistas, do SBT, e Big Brother Brasil, da Globo.
A psicóloga Marcela Teti, professora do curso de Psicologia da Faculdade São Luís de França (FSLF) e integrante do Núcleo de Desenvolvimento Docente (NDD) do Grupo Tiradentes, explica que estar em situações não corriqueiras faz com que o pensamento analítico seja mais utilizado. “Diante da novidade, o cérebro precisa entender que será necessário aprender a viver de novo, visto que não há nada igual ao que se vivia antes. Fora isso, é preciso ‘ler’ as pessoas que convivem com você e aprender a se comportar e a interagir com elas”, aponta.
“Você não pode tratar um colega de reality como se fosse sua mãe, ou sua irmã. Ainda que existam atitudes similares, são outros pensamentos, outros sentimentos. No entanto, depois de algum tempo, quando se aprendeu a conviver lá dentro e se passou a entender quem são as novas pessoas que convivem com você, o que vigora é o pensamento intuitivo”, completa Marcela.
As respostas emocionais aos estímulos causados por esse formato de programa, com o tempo, passam a ocupar o espaço subjetivo dos indivíduos confinados. “A sua identidade é moldada pelas relações que você mantém com o mundo externo. Se o mundo muda, você muda com ele também. Você vira outra pessoa, com outros pensamentos, sentimentos, comportamentos. Isso demonstra somente a evolução do ser humano e o mais importante: que a sua identidade é social, não é interna, nem nasceu com você”, destaca.
Um espelho?
A professora lembra que os reality só escancaram o que a sociedade já faz, ou seja, pessoas indisciplinadas, antiéticas e manipuladoras tendem a ser rechaçadas pela sociedade. “O rechaço nada mais é que reforço negativo. Quando uma pessoa é cancelada na Internet, nada mais é que a resposta punitiva a um comportamento público, verbal ou não verbal, que a sociedade, ou que os seguidores, não gostaram. As regras sociais, nas famílias, nas escolas, nas empresas, nas redes sociais, são regidas pelo esquema ‘reforço/punição’”, explica.
Os reality fazem tanto sucesso porque são representados, por meio dos participantes e das suas interações, os dilemas reais da sociedade. Ao serem retratados e expostos, dessa forma, fazem com que as pessoas se sintam representadas, por isso chamam tanto atenção e conseguem audiência altíssima.
Para Marcela Téti, os reality shows nos ajudam a ultrapassar as mesquinharias da vida cotidiana. “Nos ajudam a ver que metade dos nossos problemas são resultado de ego ferido, de pequenas frustrações e que deixar essas pequenices contaminarem seu convívio com os outros é uma perda muito grande. Melhor é resolver o que tiver que resolver e aproveitar a vida com o que se tem de melhor: viver bem na presença dos outros”, conclui.
Asscom | Grupo Tiradentes